sábado, abril 22, 2006

Música brasileira: um patrimônio à deriva

Música brasileira: um patrimônio à deriva20/04/2006 Cristina SaraivaEstudo recente encomendado pelo Sebrae demonstra que o maior motivo de orgulho do brasileiro, ao contrário do que se imaginava, não é o futebol: é a música. É ela que aparece para 65% dos entrevistados como fator máximo de alta auto-estima do povo. E não sem razão: no mundo inteiro, a música brasileira é reverenciada e admirada, é elemento primordial da formação de uma imagem positiva do País, é um fator de atração inequívoca pelo Brasil. Através dela e de sua força, cada vez mais, estrangeiros se interessam por nossa terra, pelo estudo de seu idioma, de sua cultura, cada vez mais se viaja ao País reforçando a economia do Turismo (para não irmos muito longe, basta analisarmos a importância dos recursos advindos do nosso Carnaval).No entanto, embora seja um dos maiores patrimônios do país e elemento fundamental na formação e afirmação de nossa identidade, a música brasileira vive à deriva, entregue à sua própria sorte e talento, e aos departamentos de marketing de grandes gravadoras e das empresas que investem em cultura através do mecanismo da renúncia fiscal.Excetuando-se talvez a Lei de Incentivos Fiscais de 1967, que permitia que o ICM devido pelas gravadoras fosse aplicado na produção nacional ( e que foi uma das responsáveis pelo grande boom de produção da música nacional, que colocou o Brasil em segundo lugar no mundo em termos de produção e consumo de música própria em um patamar de 75%, atrás apenas dos EUA), o Brasil nunca conheceu uma política efetiva e específica voltada para a sua música.Talvez por seu forte potencial de mercado, criou-se a ilusão de que a música brasileira não necessitaria ser alvo de uma política de governo para sua produção, difusão e comercialização. O tempo porém encarregou-se de demonstrar que essa concepção era falsa, e traria grandes prejuízos para uma das mais fortes expressões de nosso povo. Quando falamos genericamente em música brasileira ou em uma política para a música , devemos saber que estamos lidando com uma questão muito complexa, que envolve várias dimensões dessa importante atividade econômica e cultural. Talvez, o mais importante em um primeiro momento seja modificar o paradigma segundo o qual a cultura é mera coadjuvante no jogo da política brasileira. Desconhecer o papel estratégico da atividade cultural , e mais ainda, seu papel econômico, é um erro que precisamos urgentemente corrigir.Os sucessivos governos têm mostrado dificuldades em compreender a dimensão da atividade cultural e sua importância para nossa sociedade . Tal dificuldade se faz patente em algumas questões básicas como a própria dotação orçamentária da União, muito aquém do mínimo sugerido pela Unesco de 1% para a Cultura. Ou ainda por uma presença frágil do MinC em questões fundamentais para a nossa cultura, como por exemplo a discussão do conceito que vai nortear a programação das TVs e rádios públicas.Sem verba suficiente e sem participação mais decisiva em questões vitais, o MinC tem dificuldades pra levar adiante as grandes tarefas que se fazem necessárias. Reflexo dessa falta de estrutura, a música está hoje circunscrita a um departamento dentro da Funarte, o Cemus, que deveria dar conta da política pública para a música no país. Ora, confinar essa tarefa em um pequeno centro sem recursos próprios, sem estrutura físíca e nem recursos humanos compatíveis, vem a ser um sub-dimensionamento inaceitável da atividade musical em nosso país. Até porque, tal atividade envolve setores muito diversos, o que lhe confere uma complexidade muito grande, e exige, evidentemente, uma estrutura igualmente complexa para lidar com todas as suas facetas.Reverter esse quadro e demonstrar que a música precisa sim ter um espaço na agenda política do País, é tarefa primordial de todo artista preocupado com os rumos de nossa música e com os rumos do Brasil.
Cristina Saraiva é compositora, produtora fonográfica e membro do Núcleo Independente de Músicos.

sábado, janeiro 29, 2005

o preço da cultura

o preço da cultura

terça-feira, janeiro 25, 2005

Relatório da REUNIÃO DE PESQUISA E PATROMÔNIO 12/01

Relatório da REUNIÃO DE PESQUISA E PATROMÔNIO


No dia 12 de janeiro de 2005 reuniram-se:


Gereba, Herci, Célia e Celma, Itamar, Kátia e Valéria.



A reunião pautou-se muito mais por uma reapresentação dos participantes (já que tivemos vários novos integrantes) e pela leitura e conhecimento do relatório anterior.



Alguns pontos



1. Na questão do LEVANTAMENTO DE DADOS E PESQUISAS – Recolocamos o perigo dos preconceitos, o que levam a pesquisa de campo ou catalogação de informações já se dar de forma engessada. O Itamar citou o exemplo da Missão de Pesquisas Folclóricas(1938) idealizada por Mário de Andrade, acompanhadas e gravados por um músico - Martin Braunwieser - e, posteriormente, transcritos por outro, que apenas teve acesso ao registro sonoro. Segundo o trabalho de doutorado Álvaro Carlini (PR) isso gerou uma série de distorções e “engessamento” de determinados eventos musicais acabam se perdendo passam por essa transcrição a frio.



Também nesse sentido, Kátia, Celma e Célia colocaram que o registro não pode ser restrito apenas ao escrito. Existem registros verbais e mesmo registros que figuram na memória popular. Foi citado exemplo de que bastavam algumas sílabas de músicas tradicionais para que mulheres ligadas à tradição do canto de lavadeiras lembrassem da totalidade das obras. Ou seja, o registro em partitura deveria estar no mesmo pé que o registro silábico em diversas atividades.



Temos que saber ler e escrever tais tradições. O processo sonoro e sensível não tem que, necessariamente, passar pelo processo de alfabetização. A música tem uma característica mnemônica que lhe é peculiar, assim como a transmissão da memória verbal não registrada.



2. Direito Autoral e ECAD – Além dos já conhecidos problemas com o ECAD (já abordados por outros grupos e reuniões anteriores) foi muito bem lembrado um problema que nos atinge de frente: a taxação de FESTAS POPULARES (quadrilhas, sapateados, vaquejadas, etc). Mesmo que as músicas sejam de domínio da comunidade. Alertamos para a necessidade de que a entidade ABDIQUE DESSES DIREITOS AUTORAIS, sob pena de, ao não faze-lo, condenem ao esquecimento uma série de tradições.



3. Editoras – Novamente lembrado o problema com as editoras. Uma música, quando editada, passa a ter o direito autoral revertido ao editor. E uma prática comum é a edição LIMITADA de obras, apenas para que constem no registro da Biblioteca Nacional, e passe a representar posse nos direitos sobre ela. Vale lembrar que a publicação limitada convive lado a lado com a falta crônica de partituras e material de pesquisa.



4. Fundo de Cultura – Reafirmamos a necessidade de um FUNDO NACIONAL DE CULTURA, sob domínio público, ou seja, exercido pelo executivo e sociedade civil organizada, para complementar (ou ser mesmo o receptor) das leis de incentivos fiscais. O grupo considera essa a menos distorcida forma de repassar recursos pois se dá diretamente entre o artista e o poder público, eliminando do processo uma série de intermediários e empresas que, ao destinarem parte de seus impostos para a criação cultural, controla esse fluxo de dinheiro por seus próprios interesses. Concluímos que não existe contradição entre isso e a LEI DE INCENTIVOS FISCAIS, pois são formas complementares (e não excludentes) de fomento público.

Além disso, reafirmamos a NECESSIDADE URGENTE DE AUMENTO NA DOTAÇÃO DE VERBAS PARA A CULTURA. Atualmente contamos com 0,6% do orçamento da união. O grupo propõe que esse valor aumente para 2%.



5. Quanto à terminologia que se utiliza – abordamos que a questão de divisão dos músicos em “eruditos”, “populares”, “sertaneja”, “caipira” e tantas outras, via de regra vêm acompanhadas de um forte preconceito, que acabam se voltando para nós mesmos, quando pulverizam a categoria em panelas e bolsões de interesse. Foi muito enfatizado o papel que está tendo o FORUM PAULISTA PERMANENTE DE MÚSICA, ao unir os diversos segmentos da cultura musical brasileira, promovendo, na prática das discussões cotidianas, uma mistura de linguagens.

Achamos que não é pertinente criarmos um falso divisor de águas que, de um lado coloque a MÚSICA ERUDITA, trabalhada, elaborada e que exige muita formação e estudo do músico, e, de outro lado a MÚSICA POPULAR, que seria espontânea, com um grau de elaboração menor e menos exigente tecnicamente. Acontece que, na prática, tais conceitos vêm por água abaixo, pois nos deparamos com músicas regionais e tradições, que não apenas geram músicas e rituais ALTAMENTE ELABORADOS, como exigem uma técnica muito grande dos compositores e intérpretes e, além disso, exige que, em certos casos (transmissão de mestre pra discípulo) seja fruto da dedicação dos artistas por toda a sua vida, na apreensão e transmissão de conceitos muitas vezes centenários.



6. Mapeamento paulistano – levantamos a necessidade de um MAPEAMENTO CULTURAL PAULISTANO, no sentido de preservarmos tradições que tiveram bastante força e hoje se vêm ameaçadas, principalmente, por perderem espaços para os Bingos e Igrejas Evangélicas. Temos aí desde cinemas a espaços de forró ao vivo e casas de danças em periferia.





Grupo de Pesquisa e Patrimônio

SP, 25 de janeiro de 2005

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sábado, dezembro 04, 2004

Mapeamento Cultural e pesquisa

GRUPO DE PATRIMÔNIO E PESQUISA

No dia 16 de dezembro, reuniram-se: Célia, Celma, Gereba e Herci



I - MAPEAMENTO CULTURAL E PESQUISA



Foi constatado ser hoje a principal demanda quando se fala em PATRIMÔNIO CULTURAL: o mapeamento e
a construção de uma base de dados, coisa que avaliamos ir ao encontro de diversas falações do próprio Ministro
da Cultura.

Foi feito um breve relato sobre a classificação das categorias sugerida pelo prof. SAUL MARTINS (pres. de
Honra da Comissão Nacional do Folclore, antropólogo e doutor em Ciências Sociais), em um encontro com
Celia e Celma em Belo Horizonte, no dia 9/12 passado:

- Erudita
- Popular tradicional (ou folclórica)
- Popular não tradicional (exs: dobrado, chorinho, samba, baião)
- Rústica ou caipira (exs: coco, embolada, calango)

Gereba deu um aparte, lembrando a riqueza da cultura do povo nordestino e citou alguns dos seus mais
atuantes representantes: Bule-Bule, criador de ritmos como licuticho e tirana

Quanto à PRESERVAÇÃO DE PATRIMÔNIO IMATERIAL, levantaram-se os seguintes eixos:

1) Obras de autoria: acervos particulares, partituras, discotecas das rádios e de fãs-clube, Museu e Memorial 2) Instrumentos Musicais: artesãos e instrumentos tradicionais
3) Atividades comunitárias e artísticas: corais, bandas, fanfarras, festas tradicionais, festivais de música.
Frente a essa diversidade de produção e patrimônio, portanto, surge essa primeira NECESSIDADE
PREMENTE DE AÇÃO DIRETA:

MAPEAMENTO CULTURAL

Registro da Tradição oral
Republicação de partituras e publicação de originais
Reedição de Festas tradicionais
Incentivo à criação de Festivais de Música – apoio aos existentes
Reedição de livros de história da música e de folclore, de autores como: Renato Almeida, Luís da Câmara
Cascudo, Alceu Maynard de Araújo, Oneyda Alvarenga, Rossini Tavares de Miranda.

Além do estímulo e incentivo à pesquisa, foi citada a importância de se buscar as bases da tradição oral, muitas vezes sem registro sonoro e/ou escrito e que por isso, corre o risco de perder sua integridade e de se deturpar, com o passar dos anos. Se discutiu ainda o risco que existe na ACULTURAÇÃO (o exemplo máximo disso a gente teve na CATEQUESE, por exemplo), que pode vir tanto da mídia (TV), dos produtores de eventos ou ainda de movimentos moralistas, como os evangélicos que, ao converterem os MESTRES das manifestações populares, os proíbem de continuar a realizar seus Congados, suas Folias e Reizados e todo e qualquer ritual que tenha ligação com os santos católicos. A tradição é a alma do povo e o único portador de cultura é o homem (segundo o prof. Saul Martins).

Herci aventou a possibilidade de uma “CURADORIA DO FOLCLORE”, que seria responsável pelo perfil dos projetos, além da criação de um prêmio (vide item II - abaixo).


II - PRÊMIO NACIONAL DE PESQUISA E PATRIMÔNIO


NOSSA PRIMEIRA PROPOSTA CONCRETA.

Análogo ao Prêmio Funarte de Dramaturgia, o incentivo através de concurso não apenas PREMIA o ganhador, mas gera uma base de dados muito interessante. Para cada vencedor, dezenas de trabalhos estarão sendo catalogados.

Também seguindo a estrutura da dramaturgia, propomos um concurso REGIONALIZADO. Nas próximas reuniões estaremos destrinchando o tema e melhorando a proposta.



III – DOMÍNIO PÚBLICO


Outro ponto fundamental, e que sabemos ser bastante polêmico, é a LEI DOS HERDEIROS. Pela legislação, os herdeiros detêm os direitos sobre a obra por 50 anos, quando esta cai em domínio público.


Acontece que isso tem sido danoso para a preservação e divulgação de nossa própria cultura, pois a intransigência e a ganância acabam prejudicando a divulgação de grandes obras, que consideramos serem de PATROMÔNIO COLETIVO. Devemos ter uma assessoria legal de alguém que entenda disso, pois o direito dos herdeiros também faz parte do direito autoral. Então como conciliar as duas questões: o direito autoral e o direito público?!?


Além disso, editoras (por exemplo, a Vitale) vêm adquirindo (muitas vezes a preço de banana) o direito sobre a partitura, o que impede a regravação ou divulgação dessas obras. Pra completar, gravadoras multinacionais também vêm adquirindo o acervo de pequenas gravadoras e editoras, numa ação análoga ao REGISTRO DE PATENTE dos remédios e plantas medicinais da Amazônia.

Isso foi considerado, pelo grupo, como uma evasão real de divisas, e uma expropriação do direito autoral do povo brasileiro.

Nesse aspecto, outro problema relativo é o da ADAPTAÇÃO. Quando alguém adapta uma música tradicional ou de domínio público, o direito autoral passa a ser do ADAPTADOR, que pode impedir a divulgação e a posterior gravação. Foi citado por Celia, a título de ilustração bem humorada, o caso do “Meu limão meu limoeiro” adaptado pelo Carlos Imperial. Contou que a mãe dele, em tom jocoso, dizia: “você não tem vergonha, meu filho, de dizer que é sua... Eu embalava você nenezinho com essa música!”


IV – LEIS DE INCENTIVO

Apoiado pelos outros, Herci considerou equivocado o incentivo baseado na ISENÇÃO FISCAL. Pois isso significa privatizar um dinheiro público (de impostos) que será utilizado pelas empresas de forma individual. Ou seja, ao obter o direito de isenção, uma grande empresa vai investir esse dinheiro à revelia do poder público ou decisões da sociedade civil e, via de regra, vai financiar projetos que tragam puramente retorno de marketing ou retornos lucrativos.

Defendemos que todos os incentivos sejam baseados em FUNDOS DE CULTURA.

Inclusive a isenção fiscal deve destinar o dinheiro PARA ESSES FUNDOS DE CULTURA, para ser decidido quanto ao seu destino pelos meios sociais (câmaras, congresso, sociedade civil organizada).

Nessa questão também se levantou a existência cada vez mais forte do que chamamos de INTERMEDIADOR CULTURAL, que é o especialista em desenhar projetos para angariar apoios institucionais ou governamentais. Ressalvada a importância de gente especializada, teme-se que isso crie uma casta de atravessadores (tomando o termo da agricultura) que sabem o caminho das pedras e podem se tornar verdadeiros “escolhedores” de quem recebe ou não.

Por isso que propomos que, além dos incentivos, que existam CURSOS E SEMINÁRIOS populares que orientem os interessados diretos (artistas e artesãos) nos passos e necessidades para a formulação de pedidos e projetos. Foi citada como exemplo a lei do VAI (Valorização de Iniciativas Culturais) em São Paulo onde, quando é lançado o edital, realizam-se por toda a cidade seminários e oficinas DE ELABORAÇÃO DO PROJETO EM SI: custos, impostos, como expor a idéia e metodologia de apresentação.


Também nesse campo do APOIO FINANCEIRO, discutiu-se a questão de programas de Rádio e TV que não conseguem sobreviver por não terem um apelo comercial, e serem sumariamente cortados em suas estrutura e mesmo horários, por não atenderem aos objetivos das emissoras (temos exemplos concretos disso entre integrantes do PRÓPRIO GRUPO).

Tais programas deveriam também estar entre os PROJETOS A SEREM APOIADOS. Não sabemos a forma. Aventamos a possibilidade de uma TV pública, de qualidade, como existem em países europeus como a Itália, por exemplo. Outro tema a aprofundar.



V – NOVAS LINGUAGENS E TECNOLOGIA


Por último, mas não menos importante, achamos que a discussão sobre pesquisa e patrimônio não se restringe apenas ao campo PRESERVAÇÃO material e imaterial.

Consideramos que a pesquisa Acadêmica, busca de novas linguagens, música experimental também fazem parte de nossa discussão.

Foi mencionada a questão da Internet, e de como está mudando o conceito de troca de dados, de direitos sobre a CRIAÇÃO e DIFUSÃO CULTURAL E MISTURA DE GÊNEROS.

Lembramos que, no lançamento da Câmara Setorial, na Cinemateca, uma colega música fez uma falação justamente nesse sentido: de que fosse incorporado na Câmara uma discussão especial sobre NOVAS LINGUAGENS ARTÍSTICAS E TECNOLOGIA.

Outro ponto a ser discutido nas próximas reuniões.


São Paulo, 17 de dezembro de 2004

GT Patrimônio e Pesquisa
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COORDENAÇÂO DO GT PATRIMÔNIO E PESQUISA

Celia e Celma: celiaecelma@canalrural.com.br
Antonio Herci: antonioherci@yahoo.com.br
Gereba: wgereba@uol.com.br